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FUGAS DO MEU TINTEIRO

Imagens e palavras de um mundo onde há menos gente

FUGAS DO MEU TINTEIRO

Imagens e palavras de um mundo onde há menos gente

Azurara

João-Afonso Machado, 07.08.22

Uma terra antiga de mareantes com créditos firmados na História dos Descobrimentos, sede de um pequeno concelho extinto no século XIX. Com muita riqueza agrícola em redor. Vamos então, primeiramente, a esses abastados produtores de milho. À Casa Fontes.

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Era assim neste ubérrimo Baixo Minho. Os lavradores poderosos davam o seu próprio nome às moradas afidalgadas que iam construindo e casavam os filhos com as raparigas dos proprietários vizinhos, o modo de não fragmentarem a nascente do seu ganha-pão. A Casa Fontes tem na padieira uma data gravada - 1725; e o seu arranjo não levanta críticas, salvo no que se refere ao portal, capaz de erguer dos seus túmulos todos os antigos Fontes -  todos, sem excepção, de 1725 para cá - na compreensivel ira de verem a boa e magnífica madeira de antanho trocada por tão destituida composição em liga metálica. Ainda por cima, nas costas da Matriz manuelina, uma das peças que mais se destaca na galeria das preciosidades da Azurara.

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A igreja de Santa Maria e o cruzeiro e o pelourinho que a cercam. De olhos postos no inferno motorizado que é a EN13, e a povoação como que escondida atrás, no recato da Rua Américo Silva, a sua espinha dorsal.

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Uma artéria falante, boa contadora de aventuras. Com um comércio simpático, aqui e ali, só para amigos e vizinhos; e com a seiscentista Casa da Praça, decerto ouro das caravelas e das naus que veio vindo até ao edifício magnífico de um terratenente que acabaria juiz... em Loulé; e também ainda lá está a Misericórdia, o seu velho Hospital de S. João, a renovada residência paroquial...

Agora, porém, torna-se necessário arriscar um pouco a vida na travessia da EN13. Mas a Azurara - campestre e ribeirinha - prolonga-se no outro lado, desde logo no seu mosteiro, adquirido por um particular depois das fúrias espoliadoras do Mata-Frades.

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Gerações volvidas, o mosteiro e os seus anexos pertenciam a gente amiga, davamo-nos muito e nele veraneava o mais bonito par de olhos verdes que alguma vez conheci. Fartamente o cobicei, sem exito algum e há anos não o vejo; sei-o casado, longe e já com muitos parzinhos de olhos verdes na descendência: não se pode ter tudo...

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Os estaleiros atravessaram o Ave e, também eles, vieram perturbar o sossego da Azurara e as saudosas baixas-marés, cheias de lodo, aves pernaltas, caça, pesca e a sempre saudável ausência de multidões. Ainda assim a praia é muito aceitável desde a foz do rio quase até ao Mindelo,

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sem barracas e um mar de surfistas esperando pacientemente a boa onda. Mais lá para Setembro, com cães a darem o seu mergulho com os donos e as saudades todas da meninice do meu mais velho, rapazito das pranchas durante algum tempo...