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FUGAS DO MEU TINTEIRO

Imagens e palavras de um mundo onde há menos gente

FUGAS DO MEU TINTEIRO

Imagens e palavras de um mundo onde há menos gente

Javier (em Navarra)

João-Afonso Machado, 28.06.22

Subitamente, tudo acontece muito depressa: Pamplona ficara para trás, sai-se da autopista, entra-se numa carretera normal e topa-se a indicação no desvio para uma subida a sério - Javier. Só quem souber algo mais enveredará por aí.

Porque é do castelo de Javier que nos aproximamos. Fortificação que remontará aos sarracenos do século X, depois tomada no período da Reconquista Cristã e palco de muitos desaguizados entre as Coroas de Navarra e de Aragão.

Como qualquer castelo, o seu lugar é cimeiro. Por isso, a pequena aldeia de 100 habitantes primeiro,

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toda ela de olhos fechados, regalada na sua sesta, quatro bandeiras quietas nos mastros (as do costume: da UE, de Espanha, de Navarra e do Ayuntamento) sem a mínima intenção de me apresentarem o "Consistório", porventura a Junta de freguesia deles, que tanto me apetecia conhecer. Mas o ar fervia... E somente lá em cima, enfim, junto às muralhas parei e bebi um pedaço forte de brisa aquecida como qualquer chávena de chá fumegante para quem já vem a suar - reconfortando, feitas as contas.

O elemento de mais idade é a torre de menagem (dita de San Miguel). O castelo foi deitado ao chão de onde se levantou maior, reconstruido com outros torreões, ponte levadiça e até uma capela, em cujos murais se desenha uma Dança da Morte única em Espanha.

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Tudo não seria muito mais do que isto se, no século XVI, não pertencesse o castelo à Família de Francisco, o santo que daqui partiu, andou por França, embarcou para o Oriente, pisou terras do Japão e só não logrou passar os muros da casmurra China. S. Francisco viria a morrer de exaustão, sendo sepultado em Goa, onde ainda hoje é venerado. E também por estas bandas, em que anualmente se realizam umas concorridas Javieradas.

O castelo, em finais do século XIX,  pertencia à Duquesa de Villahermosa que o doou à Companhia de Jesus. Transformou-se então num museu evocativo de S. Francisco Xavier e é notável o acervo de pintura e peças diversas conexionadas com a sua vida. Mas, essa tarde, a minha atenção ia mais para o lado guerreiro dos Senhores de Xavier e as diversas panóplias de armas na pedra fascinavam-me.

PANOPLIA - 1.JPG

Porque ali estavam as concepções quinhentistas do combate apeado: as espadas que trocavam as voltas às cimitarras asiáticas, o papel defensivo e surpreendente das adagas, o requinte do elmo árabe e um desses capacetes que os portugueses perderam aos milhares em Alcácer Quibir. Mais um arcabuz, arma de fogo sem pressa que deixava a mecha arder até chegar à pólvora e provocar o disparo (o qual a vítima decerto aguardaria obedientemente no seu posto...).

Ou então a armadura, um pouco mais antiga mas completa,

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à primeira vista adornada com o avental da minha cozinheira, ou com algum vislumbre de Mary Quant, mas não, o saiote era ornamento de valia na indumentária dos cavaleiros da época.

Não longe do castelo, a Parroquia de la Anunciación,

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austero templo onde ainda serve a pia baptismal em que S. Francisco recebeu o seu primeiro sacramento. Visitei-a, apreciei-a, achei-a no lugar devido, ao contrário da Basílica erigida paredes meias com o castelo!

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Não por que seja de esperar qualquer ataque de muçulmanos ou aragoneses... Ou mesmo de portugueses revitalizados e audazes... Mas porque a História é a História e não era assim. 

Ficou o passeio pelas muralhas, um horizonte sem fim entre os dentes das ameias.

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E caindo a tarde, o refresco do costume no hotelzito local, um naco de conversa entre amigos e parceiros de viagem.

SEAT 600S.JPG

(Conquanto a noite fosse dormida em instalações dos Jesuítas, muito defendidas contra os rigores da invernia mas completamente permeáveis a estas vagas de calor. Horas tremendas de sofrimento e suor, quase de exaustão javierana.)

 

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