No epicentro da desgraça
Não há muito, relendo a Obra Poética do Ary dos Santos, fui dar com um extenso poema - um «rimance» - dedicado a Fernanda de Castro, do qual anotei a seguinte passagem:
«chamou oragos e magos/ anões duendes profetas/adivinhos e jograis/ sagas videntes poetas/que decifrassem os ais/que descobrissem a cura/daquela princesa triste/que morria de loucura».
Tanta gente vinda numa correria para volta de uma só! «Princesa»... lhe chamou Ary... E talvez o entenda: escasseiam as rainhas e as infantas, mas pululam as princesas, princesinhas... Em outras alturas, nós viamo-las sentadas sobre camas acolchoadas de cetins inverosímeis, vestidas de transparente disfarçado de translúcido, as pernas e os braços abertos num equilíbrio de kama sutra e o sorriso, parado e possidónio, de uma boneca de grande calibre.
Depois, de todo este folclore se apossaram as próprias donas, a realçarem a exposição do capricho em gestos pretensiosos e exigências de atenção. - Que eu sou muito vaidosa.. - ouvimos frequentemente na placidez de quem se acha tão-só generosa, eventualmente caridosa.
É claro, este manancial de princesinhas, quando contrariado, ou pressentindo menor cortejo, - simplesmente adoece. Adorna. O Destino fê-las assim frágeis, morrendo de «lonjura», numa polidez de palavras com o rabo de fora e, de uma vez por todas, sofrendo os seus dias neste mundo-cão e antecipadamente culpado de todos os males advindos da sua bondade. Isto é, afundando, anos e anos sem, definitivamente... irem ao fundo.