Ponte da Barca
A lampreia, basicamente, é uma cobra com uma ventosa na boca e uma carne negra e feia, sabendo a nada parecido com ela. Por isso não é réptil nem peixe, é um ciclóstomo. E há quem enjoe só de olhar para o bicho, jurando ser detestável sem vez alguma lhe ter metido o dente. Quando não: a lampreia come-se muito bem "à bordalesa" e justifica sempre um passeio de amigos, a almoçarada generosamente regada com verde tinto vinhão. Daí a Ponte da Barca, vila sem o pretenciosismo de querer ser cidade, nas margens do Lima onde a lampreia é apanhada quando sobe o rio para desovar (e escapa aos artefactos da vizinha Ponte de Lima, a jusante...).
Na Barca, então... Já há uns tempitos não ia lá.
E eu gosto do seu recato, gosto dos automóveis, um agora, o outro só daqui a bocado.
Gosto do comércio arrumadinho, quase de pantufas, muito sonolento; das tasquinhas e dos restaurantes, das esplanadas onde moças minhotas, daquelas lindíssimas, servem mesas vazias de gente e carregadas de um valiosíssimo silêncio.
Gosto da Misericórdia onde jovens e idosas dão, como rezam os Mandamentos, o seu contributo à comunidade.
E dos becos prenhes de história e da grandeza do granito,
fascina-me o rio na Barca, de outra timidez, outro choroso olhar, tão mais apelativo do que em Ponte de Lima.
E o Vade, o seu afluente, despenhando-se em cascata junto do moinho agora restaurante (onde decorreu o repasto)?
Nem cem metros adiante despejará as suas águas todas nele, Lima. E as margens, passeios claustrais de pescadores absortos na fortuna do tempo todo seu, as trutas a acumularem-se nos bornais...
Ponte da Barca! Ou como uma lampreia nos espeta a ideia da migração para norte, senhor todo-poderoso do rio, dos petiscos, do fim do ruído e das esplanadas de minhotas belíssimas.