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FUGAS DO MEU TINTEIRO

Imagens e palavras de um mundo onde há menos gente

FUGAS DO MEU TINTEIRO

Imagens e palavras de um mundo onde há menos gente

Por aí...

João-Afonso Machado, 31.12.22

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Com terra para quê? Oh proprietário! que vês o mundo passar lá longe, atarefado e maçador proprietário, sobraçando a pasta dos compromissos e horários, as rodinhas do trolley citando de cor os orçamentos e melhores preços.

...

Era imperioso criar distância e por isso parto e deixo as terras ao abandono. Apenas viajarão comigo, no meu coração, as minhas raízes porque esse é o lugar delas. Fundas e inarrancáveis.

Hoje ainda. Adeus. Acreditem, porém, nada é enorme a não ser a capacidade de nos reencontrarmos.

 

Por aí...

João-Afonso Machado, 13.11.22

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Podem ter sido os lobos. Ou um festim humano. Enfim, pode ter sido a velhice, a doença, o rigor da estiagem...

Mas aquela caveira ovina veio comigo nas minhas ideias. Para não ficar sozinha, longe dos outros restos mortais seus parceiros. Depois de picada e cuspida por algum grifo a voar desde os penhascos.

 

Por aí...

João-Afonso Machado, 21.08.22

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Empurrei o breve instante de luxo e disparei porta fora como quem apedreja automóveis. Lá em cima, no Norte mais nortenho, esqueci a maré hoteleira e saí à socapa de eléctrico, como todos os contentes com a vida.

Mas incognitamente, embuçado, não fosse a multidão dar pela relíquia e seguir o exemplo.

 

Por aí...

João-Afonso Machado, 23.06.22

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Tudo já não é. Sequer os cimos, transformados em garimpeiros do vento, e as encostas, socalcos anónimos e despidos. Como as searas que os ratos e as cidades vêm devorando, de conluio com serpentes infindas asfaltadas.

Os motores rugem, bestas disformes mas reais. Aqui não cabe a ficção científica e o traço restante da Natureza é um aqueduto apenas. Porque os homens esqueceram - que o construiram e de o destruir.

 

Por aí...

João-Afonso Machado, 26.05.22

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Creio andar perto de um oriente qualquer nascido a bordo. De sobejo mais à vontade nas planícies aquáticas onde penso duas vezes antes de libertar a vontade das velas ou dos remos. Naveguemos, pois. Haverá uma âncora e um destino.

Esse tal destino que me dá um passo em frente. Porque, entretanto, continuo pensando onde caminho mais depressa para mim: se nas águas, se em terra.

 

Por aí...

João-Afonso Machado, 24.04.22

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Não foi ainda mas será um dia. Para isso servem as montanhas, resolutas pernas humanas desafiando a altitude. E não há homem que não queira subir, subir, subir...

(Não exactamente sempre no que toca a valores patrimoniais...)

«Há uma leveza que precisamos de aprender: uma transparência que dilata a alma. Que é, no fundo, aquilo que nos permite atravessar a noite, a adversidade e a contradição ligados à chama pequenina da esperança» (José Tolentino de Mendonça).

 

Por aí...

João-Afonso Machado, 12.02.22

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Sinto agora todo o pulsar da inferioridade descritiva ou narrativa. Como se ela nos seus carris, muito compenetrada e pontual, já avistasse no horizonte a estação, os passageiros e apitasse alegremente, a anunciar-se, enquanto de lá uma voz correctíssima informava a plataforma, no maior rigor e placidez.

Descrever, narrar... Sendo tudo uma eterna contorsão de silêncios e emoções inominadas. Uma implosão de ideias, o poema jamais alcançado. É noite, restam-nos ainda algumas horas para ignorar os rituais da sincronia. Longe da geometria das palavras, simplesmente por aí...

 

Por aí...

João-Afonso Machado, 31.12.21

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Não sei explicar onde estou ou se já voltei no roldão das neblinas. Descendo os cumes pelo corrimão da humidade e do frio. Ainda assim não recordo haja nevado no corropio da montanha.

Mas se nevou... então ainda não cheguei, prendem-me lá esparsas passadas brancas de todas as lendas envoltas em pele de urso.

Quiçá para o ano...

 

Por aí...

João-Afonso Machado, 24.12.21

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Saio hoje quando a cidadezinha, alma minha, já recolheu a casa. Na hora precisa do silêncio em direcção um nada a norte, onde o meu sangue nasceu e ainda verte. Lá no fim da floresta e dos prados, na quietude das torres do granito no tempo. Vou porque não quis ficar, haverá sempre a presença de um Pai e de uma Mãe descendo do Céu agora mesmo. E há crianças, a nossa turbulência trespassada. (As crianças são sempre um espelho do Passado.) Vou, já disse, na esperança de beijos verdadeiros. E de abraços felizes.

Sigo o rumo de uma mensagem na rotunda de tantas vias. Se for certeiro, poderei dizer que em espírito aperto - no tal abraço feliz - esse mundo inteiro.

Porque só me comovem os santos com quem convivi. E a eles, e aos mais, a todos desejo o gozo de um feliz - santo... - Natal!

 

Por aí...

João-Afonso Machado, 17.11.21

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Tenciono decifrar o enigma dos canais. Já não, porém, a opacidade das suas águas. Ficar-me-ei pelos humanos à janela, ou vagueando distraídos nas margens. As gralhas marcarão presença e as pedras ribeirinhas acoitarão ratazanas imundas e negras, gigantescas. Mas os insondáveis fundos lodosos... será ali o palácio da imperadora de todas as enguias?