Vila do Conde
Mas se não ponho o bridão à boca ainda sai um livro todo... As recordações de Vila do Conde são isso - são os tempos do tractor que levava a tralha e as galinhas para um trimestre quase inteiro onde não havia supermercados; do leite vendido porta-a-porta, manhã cedinho, e as medidas da família - quartilho e meio - a sair da bilha logo então; são as peixeiras, a canastra descida da rosca na cabeça, e a ciência da Avó a negociar o preço do goraz, do capatão, do robalo...; e as manhãs desertas, cinzentas, a ronca da Póvoa invisivel a uivar longe, depois da cortina do nevoeiro.
De seguida, as bicicletas. O mundo era nosso, corrido nos passeios, quase repimpando na barriga do sargento do posto local da GNR. Complacentemente...
Eram as ruas todas por conta das tantas gerações que congregavam o bairro balnear.
E a praia, as barracas como casario vizinho e amigo. O banheiro Baltazar, um vigilante que tranquilizava os nossos pais. E a Sra. Ana dos bolos...
Tudo já pertence ao passado. Vila do Conde morreu para os que a distinguiram a única que foi. Por ela restam alguns fantasmas apenas.
Sou um deles. (Dos mais inofensivos...) Onde antigamente os carpinteiros serravam e aplainavam o madeirame das traineiras, eu e os velhotes sobrantes matamos saudades e celebramos estranhos rituais de eternização em almoços de peixinho bem regado.